Considerações e opinações sobre a sétima arte.

sexta-feira, 26 de março de 2010

O Livro de Eli: O Mad Max Cristão


E eis que surge o Apocalipse pelas mãos dos irmãos Albert e Allen Hughes. Um Apocalipse no mínimo peculiar, visto que envolve o já veterano Denzel Washingtonnum papel de lobo solitário género Mad MaxO Livro de Eli (Book of Eli), uma abordagem apocalíptica do futuro que se aproxima, é uma boa amostra de cinema. E isso deve-se, principalmente, pela óptima fotografia que, por sua vez, proporciona uma fantástica atmosfera ao longo de todo o filme, que, não ajudada pelo argumento, se vai desvanecendo aos poucos. A sua qualidade é inequívoca. Só que os erros surgem com facilidade, numa obra que aposta forte num campo, a fotografia neste caso, e se desleixa nos outros.
O Livro de Eli conta-nos a história de Eli (coincidência?), interpretado por Denzel Washington, num período pós-guerra futurístico, onde grande parte da população foi aniquilada e a civilização destruída. Eli guarda com a vida um livro (outra coincidência) bastante enigmático. As suas palavras, diz Eli, são profundas e poderão ser usadas como forma de poder sobre os homens. Consequentemente não há quem não queira apoderar-se do estranho livro, nomeadamente Carnegie, um chefe de guerrilha que controla militarmente a zona local, interpretado por Gary Oldman. Neste momento facilmente descobrimos, e não pelo sinal da cruz impresso na capa do livro, mas sim pelas restantes características, que se trata de um exemplar da Bíblia, que por sua vez é o único no mundo. Interessante. Realmente esta premissa inicial do argumento promete dar frutos bastante deliciosos. Um cenário apocalíptico, um lobo solitário numa missão, um livro único com poderes sobre os homens e a ganância e ambição natural de outros homens. Quereríamos melhor para começar este Mad Max do séc. XXI? Sim. Eu pessoalmente queria. Não falo destas premissas iniciais que deixam água na boca de qualquer pessoa, mas sim de alguma continuidade que deveria ter sido dada às mesmas. Quer dizer, houve continuidade, mas uma continuidade morta. Ma deixemos os abstraccionismos de parte. O que quero focalizar é que apartir deste momento toda a narrativa fílmica vai desvanecer, cair em alguns clichés (não muitos) e torna-se bastante monótona, com cenas de acção fracas e desenvolvimentos narrativos pouco complexos e criativos. E isto durante uma parcela bastante longa do filme. Claro que, devido a alguns factores que já irei explicitar, não caímos no aborrecimento, mas fica o sentimento de pena por ter sido desperdiçada uma base narrativa tão promissora que, mesmo com um final “semi” surpreendente, não conquista o imaginário dos mais exigentes, revelando a notória inexperiência de Gary Whitta, o argumentista.
Mas falemos do nosso amigo Denzel Washington e da sua trabalhada personagem. Digo trabalhada de uma forma um pouco exacerbada, claro. Eli, um verdadeiro homem com H que domina as técnicas de combate corpo a corpo, tem aquele toque de cavaleiro andante misterioso e de poucas palavras. Mas também não passa disso. Apesar de Washington desenvolver os diálogos que tem com Solara, a personagem interpretada por Mila Kunis, com certa naturalidade que cria na personagem muito realismo, o seu desempenho não é espectacular, ficando-se pelo Bom. O resto do elenco segue as pegadas do protagonista. Talvez Gary Oldman se destaque no seu papel de vilão, mas como a sua personagem é muito menos trabalhada, em comparação com Eli, não poderemos fazer um juízo de valor justo.
Por fim, resta-nos o melhor. A jóia deste filme: A fotografia. O Livro de Eli tem uma requintada abordagem fotográfica. A forma como é utilizada a imagem chega, em alguns planos, a tocar o campo do genial. Não só os jogos de cor, onde  se apostou nos tons cinza e sépia, jogando com o cenário desértico do filme, mas também nos planos de fundo onde são inteligentemente enquadradas as personagens. Recordo-me de um plano da segunda metade do filme, onde Eli e Solara olham um para o outro num plano afastado, onde cada personagem se coloca em cada extremo do enquadramento, e, juntamente com uma ligeira inclinação de câmara, causa uma simetria perfeitamente bela.
Devo concluir, deste modo, reafirmado a qualidade do filme O Livro de Eli. Contudo,  não subam as vossas fasquias. Aliás, foi esperando pouco que visualizei este filme. E só desta forma ele foi capaz de me surpreender.O Livro de Eli é um filme com certo requinte, com muito potencial, mas que morre na praia. Valerá muito pela sua qualidade estética e pouco pelo resto.

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